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Política

DANIEL LIMA - 02/05/2025

Deu a louca em Paulinho Serra. Ela acabou de cuspir imprevidência no  prato político que cansou de comer. Numa declaração mais que surpreendente, suicida até, o ex-prefeito de Santo André,  em fase de negociação do futuro político envolvendo Tucanos e Podemos,  simplesmente rejeitou a periferia petista e lulista que o elegeu, que elegeu seu sucessor, que elegeu sua mulher. Além disso,  também fez pouco-caso da classe média mais bolsonarista e que engrossou a votação dele e dos demais nos últimos anos.

Paulinho Serra disse com todas as letras que 70% das pessoas com as quais tem mantido contato rejeitam tanto o lulismo quanto o Bolsonarismo. Simplificando: o eleitorado de Paulinho Serra e seus parceiros, em larga escala, pertence a grupos polarizados que não contribuem para o futuro do País.

Essa é a retórica do que restou do PSDB e do avança no Podemos. O ajuntamento da duas agremiações seria uma maneira de ganhar musculatura eleitoral que a polarização atrapalharia. 

(¨Precisamos de uma alternativa fora do lulopetismo e do bolsonarismo. Por quê? Porque a gente avalia que isso está prejudicando o Brasil. Nada contra as pessoas. Não é pessoal. Nem contra o Bolsonaro, nem contra o Lula. Ambos têm qualidades e defeitos como todo mundo, como todo ser humano. Não se trata de uma crítica pessoal. São modelos e o clima no País. Eles se autoalimentam nessa guerra. Até camisa da Seleção virou alvo de polarização” – disse Paulinho Serra) 

Tenho dúvidas se Paulinho Serra acabara de tomar um alucinógeno ideológico ou se imaginou descobridor dos sete mares da oportunidade de ouro para dar o pulo do gato. De fato, Paulinho Serra pegou carona na proposta nacional dos dois partidos que querem um protagonismo perdido para bolsonaristas e petistas. Um partido, o partido de Paulinho Serra, que tem como um dos caciques nacionais o ex-governador de Minas Gerais, Aécio Neves. E que já contou com Geraldo Alckmin, três vezes governador paulista. E tantos outros que perderam espaço depois de escândalos nacionais.

BARCO À DERIVA

Como está com o próprio barco político-partidário à deriva, é possível que Paulinho Serra precisava mesmo enviar aos tucanos sobreviventes e aos podemistas esperançosos a mensagem de que podem contar com ele. Algo estranho para quem ainda outro dia apareceu nos jornais de papel ao lado do presidente do PSD, Gilberto Kassab. O ex-prefeito de São Paulo tem tanta habilidade política que mantém um dos pés no PT de Lula da Silva e outro no Republicamos de Tarcísio de Freitas, bolsonarista de primeira hora.

Qualquer que seja o motivo, Paulinho Serra deu um salto no escuro. A solução que apresenta é velha de guerra e se tem comprovado ainda fora de qualquer perspectiva robusta: a terceira via que supostamente colocaria o governador gaúcho Eduardo Leite como candidato à Presidência com potencial de sucesso não passa de exploração de fantasias. Melhor, entretanto, que nada.  

Paulinho Serra jamais disse que detestava os extremismos à direita e à esquerda. Paulinho Serra fez da direita e da esquerda (que são amplas e não se limitam ao que muito chamam de extremistas) pontos estratégicos para tanto sucesso eleitoral em Santo André.

ASSISTENCIALISMO VITORIOSO

Com programas assistencialistas como Moeda Verde e tantos outros que embalaram a carreira da primeira-dama Carolina Serra, Paulinho Serra fez da mulher deputada estadual. Quase 90% dos votos foram registrados em Santo André. Uma combinação perfeita de aderência da periferia e apoio da classe média.

Nada menos que 120 entidades assistenciais se juntaram na campanha eleitoral da primeira-dama. Um show de competência eleitoral. Sem polarização escancarada, mas sub-reptícia, porque Santo André não é uma ilha antipolarização, a politica assistencial levada à campanha de Carolina Serra amealhou os votos petistas do Bolsa Família.

O petismo lulista e o conservadorismo bolsonarista constituíram fontes preciosas de sucesso. Para a vitória de Carolina Serra, fecharam-se as porteiras em Santo André. Todos os candidatos que pudessem atrapalhar foram tirados do páreo. E os candidatos a deputado federal foram de fato cabos eleitorais de Carolina Serra.

CLASSE MÉDIA CONSERVADORA

No centro conservador e no centro expandido de Santo André, de classe média dos tempos de industrialização fértil, a imagem de moço comportado, de família antiga do Município, e o controle geral da mídia, fizeram de Paulinho Serra e das propostas do grupo ao qual pertence vencedores quase massacrantes.

O PT em Santo André só existe quando Lula da Silva é candidato. Disputou pau a pau a preferência dos eleitores em 2022. A diferença pró-Bolsonaro foi de quatro pontos percentuais, apenas. O PT de Santo André nas disputas municipais é cada vez mais uma pálida sombra. Não se sustenta. É vexatório.

Até porque boa parte das lideranças petistas foi capturada pelo grupo de Paulino Serra. Em resumo: não existe oposição em Santo André. Tudo foi meticulosamente construído, com apoio à esquerda e à direita que, agora, Paulinho Serra descarta.  

CLAQUE SILENCIOSA

Quando publiquei ontem à tarde a informação que agora aprofundo sobre as declarações de Paulinho Serra, de posicionamento de hostilidade tácita a bolsonaristas e a petistas, houve silêncio impressionante nos grupos de WhatsApp. Em circunstâncias normais, há alguns nichos de claque organizada de Paulinho Serra, prontos a reagir a qualquer contrariedade. Apenas um violador de hora alheia se manifestou num dos grupos da claque de Paulinho Serra. Um idiota que zomba da inteligência alheia.

Como grande parte dos eleitores de Paulinho Serra é de origem conservadora, manifestadamente bolsonarista, fico imaginando o que eles, esses empedernidos caçadores de jornalistas independentes, fizeram nas horas sequenciais e mesmo agora, quando escrevo estas linhas.

Costumo ouvir podcast enquanto preparo nos horários rigidamente marcados o almoço e o jantar de minhas cachorras. Três vezes por semana, ou até mais, essa é uma tarefa que me cabe em casa. Aproveito esse período para acompanhar questões que unam obrigatoriedade de cozinheiro e demandas próprias do jornalismo.

Quando ouvi o que disse Paulinho Serra sobre bolsonaristas e petistas no podcast do Diário do Grande ABC, não acreditei. Interrompi minha atividade e voltei a gravação. Estava lá com clareza: o ex-prefeito de Santo André e pretendente a alguma coisa eleitoral fora do circuito municipal, vendendo-se como possível candidato a governador ou a senador, dizia com clareza: temos uma opção de centro, de terceira via, e não queremos nem a extrema direita nem a extrema esquerda.

MISTURAS PRÁTICAS

Como a extrema direita e adjacências é Jair Bolsonaro, sempre a partir do centro conservador, e como a extrema esquerda é Lula da Silva, sempre a partir da centro-esquerda de viés socialista, está claro que tanto uma carta quanto outra estão fora do baralho de Paulinho Serra. Isso mesmo: os aliados e parceiros de ontem já não servem para o amanhã.

Gostaria de ver a cara dos militantes bolsonaristas que adotaram Paulinho Serra nos últimos anos. E também a cara de Paulinho Serra que agora está nos Estados Unidos, pronto para frequentar umas aulas sobre Parcerias Públicas e Privadas e Infraestrutura, conforme foi noticiado e, mais que isso, ele disse durante a entrevista.

O erro crasso de Paulinho Serra é achar ou acreditar ou supor ou sugerir que existe um bolsonarismo ou uma direita conservadora que não comporte gradações em aguerrimento, sempre unidas no sentido ideológico de ser, com variáveis naturais. E erra Paulinho Serra ao  acreditar também que os chamados progressistas que enxergam Lula da Silva como principal referência não sejam também uma massa disforme em vários aspectos sociais, mas que se unem na hora do vamos ver como fica.

PEDAÇO DESCONFIADO

Paulinho Serra possivelmente acredita em marqueteiros que lhe tenham dito sobre a ocupação de 30% do território eleitoral por eleitores nem conservadores como os direitistas nem socialistas como os esquerdistas. Seriam esses 30% dos eleitores uma massa fácil de capturar, porque haveria um vácuo que a polarização não teria agarrada pelo colarinho do pragmatismo eleitoral.

Existir esses 30% até existem, porque as pesquisas dão esse direcionamento. O que Paulinho Serra e tantos outros que acreditam nisso ainda não se deram conta é que essa massa é volúvel, faz certo biquinho ao flertar com candidaturas menos monolíticas à direita e à esquerda, e não enxerga uma única alternativa confiável

Ou seja: o terço capaz de levar alguém à presidência da República em repulsa a Lula da Silva e a Bolsonaro ainda é uma projeção sem sustentação sociológica. Até porque esse terço tão volúvel quanto precavido, deu no que deu desde a redemocratização do País. O rompimento do dique da polarização em direção ao passado não seria a trajetória do Brasil do futuro.

Sorte de Paulinho Serra pelo menos em termos locais é que por não existe oposição. O desprezo aos bolsonaristas e aos lulistas não deverá lhe custar muito caro em forma de influência arrasadora nas disputas locais. Mas se houver expansionismo territorial de Paulinho Serra rumo a disputas que tenham os eleitores paulistas como alvo, é muito possível, mais que provável, que venha a ser exposto nas mídias mais abrangentes. Paulinho Serra serviu-se o tempo todo da direita e da esquerda com pragmatismo.

TARCISIO DISPUTADO

Até recentemente, aliás, Paulino Serra jamais abriu a boca para avaliar o quadro político nacional. De uns dias para cá ocupou as mídias sociais para registrar posições típicas do que expôs no podcast.

O que se pergunta é até que ponto Paulinho Serra estaria preparado para sair de uma enrascada em forma de questionamento que exporia a contradição de nova incursão. Afinal, se a polarização é um mal para o País (entendo, cá entre nós, que o Teatro das Tesouras entre tucanos e petistas, explodido por João Doria, foi muito pior) por que então requisitou em desespero os préstimos do governador Tarcísio de Freitas, para vencer a disputa em Santo André no ano passado com Gilvan Júnior?

Alguém tem alguma dúvida de que Paulinho Serra trocou cotoveladas públicas e literais com o adversário Luiz Zacarias para ocupar espaço mais próximo numa visita do governador na corrida eleitoral de outubro passado? O mesmo governador que foi usado nos últimos dias de campanha como porta-estandarte da campanha de Gilvan Júnior. Paulinho por acaso pretenderia convencer a todos que Tarcísio de Freitas não é bolsonarista, embora um bolsonarista mais diplomático, até mesmo mais preparado, mas um bolsonarista declarado e confesso?



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