Economia

Faltam 293 fábricas da Toyota
na região. Santo André lidera

  DANIEL LIMA - 11/04/2022

Se você ficou preocupado com os 550 empregos formais que a unidade de autopeças da Toyota está fechando em São Bernardo é porque não sabe da missa um terço. Se você está muito preocupado, começou a entender o que acontece há muito tempo.  

A situação é muito mais grave do que você imagina. A crise do emprego industrial com carteira assinada é estrutural no Grande ABC. E vem de longe. Estrutural é algo que tem raízes profundas. Algo que não se desfaz com pó de pirlimpimpim demagógico.  

Os efeitos da destruição do emprego industrial são a gradativa redução da riqueza acumulada pela população.  

Estamos caindo pelas tabelas no PIB de Consumo. Que é derivado do PIB Convencional. PIB Convencional trata de riqueza produzida. Uma coisa leva à outra. E as duas, combinadas, levam à pobreza e à miséria.  

POBREZA EXPANDIDA  

A pobreza do Grande ABC tem o tamanho da soma de São Caetano e Diadema no total de domicílios da região.  Os demais municípios são, principalmente, de classe média baixíssima. Ricos e classe média tradicional desaparecem aos poucos.  

Nos últimos 35 anos, entre 1985 e 2020, o Grande ABC viu desaparecerem 293 fábricas da Toyota de carteiras assinadas. Emprego industrial no Grande ABC é o emprego mais bem remunerado. E que conta com suporte adicional de benefícios que o Estado sonega.  

Nesse período a população do Grande ABC avançou em um milhão de habitantes. De 1,8 milhão para 2,8 milhões. Não há orçamento público que dê jeito.  

FALHAS COGNITIVAS  

Prefeito que não sabe utilizar a decadência gradual e irreversível do orçamento público para ser compreendido pela população é prefeito com debilidade cognitiva. Deixa de explicitar o óbvio. E o óbvio é que o tamanho da encrenca é maior do que parece. 

Somente em duas ou três cidades da região o emprego industrial paga menos que os servidores públicos na ativa. Santo André, por exemplo. Diadema também. Emprego industrial é sinônimo de mobilidade social.  

O novo balanço do emprego industrial formal é mais uma expressão explícita da desindustrialização negada por insensíveis sociais que fazem politicas eleitoreiras onde se aprofunda a desigualdade social da pior espécie.  

Ricos e a classe média refluem em relação aos pobres e miseráveis que seguem pobres e miseráveis.  

SANTO ANDRÉ À FRENTE  

Santo André lidera o ranking da quebra de empregos formais do setor por causa do título de campeã nacional de desindustrialização.  

Santo André perdeu 61% do efetivo de emprego industrial no período de 35 anos. E o prefeito Paulinho Serra faz estardalhaço com o investimento da Prometeon, que vai gerar 40 empregos. Seria mil vezes melhor se contratasse uma consultoria especializada em competitividade econômica.  

A festa de aniversário de Santo André além de provinciana é enganadora. Serve de cortina de fumaça às barbaridades em forma de omissões e privilégios. Paulinho Serra pegou um rabo de foguete. Não se dá conta disso. Para o bem e para o mal.  

À frente do Clube dos Prefeitos nos últimos anos, Paulinho Serra ignora as durezas do prélio de uma quebradeira socioeconômica que vem do passado sobre o qual não tem responsabilidade, mas de cujo conhecimento deveriam partir ações reestruturantes.  

PRINCÍPIOS LÓGICOS  

Segui dois princípios básicos para definir a quantidade e a especificidade da duríssima, longeva e insidiosa perda de riqueza regional em forma de rebaixamento do emprego industrial.  

O primeiro com a captura de dados oficiais, aos quais dedico atenção há várias décadas. O segundo, a hierarquização de acordo com o estoque disponível entre a data-base, 1985, e a data-limite, 2020.  

Os dados de 2021 do emprego industrial na região ainda não saíram oficialmente do forno do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Não deverão alterar quase nada os números registrados em 35 anos. Uma grande embarcação não muda a direção do dia para a noite. Mesmo quando afunda.  

Embora numericamente São Bernardo tenha sentido ao longo de mais de três décadas maior queda na quantidade de emprego industrial com carteira assinada, a linha relativa é inferior a apresentada por Santo André. Esse princípio é obedecido rigorosamente por CapitalSocial há muitos anos. A movimentação do estoque é que determina a colocação. 

ESTOQUE REGULADOR  

Santo André perdeu 61,66% de empregos industriais no período: contava com 64.491 e caiu para 24.722. Uma perda líquida de 39.769 postos de trabalho. Menos que os 79.140 postos de trabalho que foram para o ralo em São Bernardo.  

A diferença é que Santo André registrava em dezembro de 1985 o total de 64.491 carteiras assinadas nas fábricas, enquanto São Bernardo contabilizava 147.781. Ou seja: o estoque de São Bernardo baixou 53,52% no período. Oito pontos percentuais menos que o estoque de Santo André.  

Desconsiderar os estoques comparativos para aferir estragos ou benefícios de determinadas situações, econômicas ou não, é grave erro geralmente repetido pela mídia.  

É evidente que numa região desindustrializada como o Grande ABC quem tem mais quantitativamente perde mais também quantitativamente. Mas quando existe o filtro do equilíbrio estatístico, muito pode ocorrer além das fronteiras de visões apaixonadas.  

O que vale para o ranking de homicídios e de casos letais do Coronavírus também vale, semelhantemente, ao quadro de desemprego estrutural da região.  

QUASE METADE  

Em 1985, o Grande ABC contava com 337.640 trabalhadores com carteira assinada no setor industrial. A desindustrialização ainda era incipiente, como resultado do movimento sindical emergente em São Bernardo no fim dos anos 1980 e da suicida política de descentralização produtiva da Região Metropolitana de São Paulo, incentivada pelo governo do Estado e pela guerra fiscal também vigente em outros Estados da Federação. 

Em 2020, ponta desses dados, três décadas e meia depois, o total de empregos industriais com carteira assinada caiu para 176.561 trabalhadores.  

Os mitigadores dos estragos argumentam que parte dos empregos que sumiram se deram por conta de terceirizações de atividades que não estavam ligadas diretamente à produção, e mesmo algumas que estavam diretamente ligadas.  

Esse contingente é ínfimo perto de fechamentos de empresas, evasão de empresas, miniaturização de empresas.  

Processos aos quais todos os municípios passaram. E muitos avançaram. Como mostraremos numa outra edição. 

QUASE EMPATADOS  

O fato é que a mídia chapa-branca, defensora de gestores públicos ignorantes em economia, há muito tempo foge do enfrentamento natural.  

E o enfrentamento natural é o Grande ABC criar condições próprias para sair da pasmaceira congeladora de medidas que já tardam.  

Quem observa os números de antes e de agora, ou seja, de 1985 e de 2020, vai observar que o desfalque de trabalhadores industriais chega a 161.061 postos com carteira assinada. Um exército abatido que praticamente empata com o exército de trabalhadores ainda mantidos pelas empresas, que totaliza 176.561.  

No cômputo geral, o Grande ABC desses 35 anos de desindustrialização perdeu em média 47,70% dos trabalhadores com carteira assinada.  

MAUÁ É EXCEÇÃO  

Santo André, líder com 61,66%, está 14 pontos percentuais acima da média. São Bernardo contabiliza 53,52% de perda, São Caetano 49,15%, Diadema 39,90%, Ribeirão Pires 28,38% e Rio Grande da Serra 17,73%. 

Mauá é o único endereço da região que registra saldo positivo de emprego industrial em 35 anos. Obteve ganho de 17,73%, resultado diretamente ligado ao crescimento da produção da indústria químico-petroquímica, do Polo de Capuava, que espalhou pequenas empresas no território. E também da migração de indústrias de Santo André.  

Mauá contava com 16.267 trabalhadores industriais formais em 1985 e passou para 19.735. Ganhou 3.468 postos de trabalho, ou o equivalente a 6,3 fábricas da Toyota desertora.  

Voltaremos ao assunto na próxima edição. A Economia em transe do Grande ABC é prioridade de CapitalSocial, assim como o foi de LivreMercado. São 32 anos de análises que vários dos poderosos de plantão preferem desdenhar. Estão preocupados com a próxima eleição. 

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