MENOS ESTADO, MAIS
EMPREENDEDORISMO
Se os marqueteiros de Paulinho Serra não fossem tão despreparados para entender o que se passa em Santo André e no Grande ABC como um todo, para não dizer no País, o mote manquitola de “Mais Gestão, Menos Polarização” seria compulsoriamente substituído pelo que apresento na manchetíssima de hoje. “Menos Estado, Mais Empreendedorismo” é mais que um contraponto ao desperdício de tempo e espaço do colunista do Diário do Grande ABC. É um desafio às instituições públicas e privadas da região. Seria demais mesmo para Paulinho Serra de passagem triunfalista e varejista em Santo André.
Já imaginam uma campanha de reação da sociedade regional que tenha a embocadura filosófica e prática, para não dizer moral e ética, de “Menos Estado, Mais Empreendedorismo”? Se imaginou, tudo que vier à cabeça é pouco, tamanha é a amplitude da acoplagem dos dois conceitos embutidos.
Vou explicar: “Menos Estado, Mais Empreendedorismo” não significa dizer que o Estado, no caso o Estado Municipal de sete endereços, estaria excluído da campanha. Estado bom é Estado empreendedor, não Estado industrializador de impostos.
TODOS ENVOLVIDOS
A percepção discriminatória de que empreendedorismo é um verbete nascido do ventre de capitalistas impiedosos é coisa antiga, portanto. Legado de extrativistas obtusos que só perdem para os chamados progressistas avessos ao capitalismo, regressistas de fato.
Infelizmente, e vou restringir as observações aos poucos mais de 800 quilômetros quadrados do Grande ABC, tanto o Estado Municipal de prefeituras, e os representantes do capital, no caso as entidades de classe empresarial e também o sindicalismo de trabalhadores, estão a léguas de distância de combate ao desfiladeiro do Desenvolvimento Econômico.
Ganha um doce de batata doce o leitor que encontrar ao longo dos últimos 40 anos um diagnóstico sequer, personalizado, documentado, carimbado, original, de instituições econômicas da região. O Clube dos Comerciantes (associações comerciais), o Clube dos Prefeitos, o Clube dos Construtores e tantas outros clubes flutuam invariavelmente entre cuidados burocráticos junto aos associados e aproximações com os donos dos Executivos locais.
Incluo nessa lista também todos os sindicatos de trabalhadores, porque o fundamento dessa lista é a produção de estudos e propostas muito à frente do corporativismo, ou seja, dos interesses exclusivamente de classe.
COMBINAÇÕES
Resumo da ópera: embora os dirigentes políticos, principalmente os grupos que passaram pelos Executivos, sejam mesmo e devam ser os grandes vilões da esculhambação do ambiente regional, os representantes empresariais, em larga escala e com poucas exceções, também pouco fizeram, além de aplicar politicas de boa-vizinhança com os poderosos de plantão.
Tanto é verdade que não exagero e tampouco ludibrio a boa-fé dos leitores ao afirmar que há exemplos fluviais de gestores de entidades empresariais que seguem rotina de concubinato com ocupantes dos Paços Municipais na alocação de privilégios. Traduzindo? Cabides de emprego são montados tradicionalmente para o fechamento de acordos de submissão às supostas forças vivas da sociedade.
Por conta disso e de tantas outras situações, a campanha “Menos Estado, Mais Empreendedorismo” seria vista pelos dirigentes classistas e sindicais com desdém. Afinal, todos se beneficiam de alguma forma de compadrios sustentados pelo pacto do silêncio. Mexer em qualquer peça do xadrez de mandachuvas e mandachuvinhas no Grande ABC implica tratado de guerra.
MERCADO IMOBILIÁRIO
Dá para imaginar o que se passa nos bastidores dos municípios da região nestes tempos de formulação dos Planos Diretores, mecanismo que vai determinar para onde e como nos próximos 10 anos serão conduzidos investimentos do mercado imobiliário, notório parceiro eleitoral dos favoritos aos paços.
Por conta disso e de muito mais o Clube dos Construtores sempre botou os pés nos corredores e gabinetes de altas patentes dos paços municipais para aferir até que ponto estaria aberta a porteira de desburocratização que determinaria a ocupação verticalizada dos empreendimentos com o máximo de rentabilidade e o mínimo de urbanismo responsável. O caos urbano do Grande ABC é resultado de organização coletiva sob o manto da legalidade instrumental mais que viciada e recompensada.
Desenhar o futuro imobiliário do Grande ABC é uma ação compartilhada da qual geralmente estão excluídos do baile de serpentinas e confetes os especialistas no assunto, gente sem intimidades com qualquer das partes. Algo inconcebível para os formuladores da legalidade enviesada.
MAIS IMPOSTOS
Dado esse exemplo prático, é elementar que “Menos Estado, Mais Empreendedorismo” jamais terá a aderência necessária para saltar do papel e ganhar formato de cidadania.
Embora as prefeituras da região tenham sofrido rebaixamento de recursos financeiros por conta da desindustrialização, porque ninguém fica impune à desindustrialização, os registros ao longo dos anos revelam que a carga tributária municipal, em forma de ISS, IPTU, ITBI, taxas e contribuições, avançou muito acima da média salarial da População Economicamente Ativa, da valorização imobiliária e da renda por habitante.
Ou seja: vivemos duplo ataque aos bolsos dos contribuintes. Afinal, todos são marcados implacavelmente pela execução de processos de reparação de perdas financeiras pelas prefeituras e sofrem com as comprovadíssimas quedas financeiras determinadas pelo desemprego, pelo emprego de remuneração descendente e pela queda patrimonial imobilizada.
O embevecimento ditado por manchetes adocicadas que lustram o ego, mas comprometem ainda mais a percepção dos fatos coloca a sociedade regional em estado sensorial deplorável. Quando o coletivo é incapaz de compreender o que se passa porque o que se passa é instrumentalizado como descarte em favor de delírios de grandeza, só resta rezar.
GUIZO NO PESCOÇO
Por mais que revelações sejam comprovadas, sempre haverá um resto de resto de desconfiança de que há um pessimismo a ser desconsiderado. O autoengano nesse caso é uma tentativa inconsistente de supor que os impactos individuais não passariam mesmo de casos isolados.
Uma campanha institucional que despertasse o empreendedorismo planejado no Grande ABC, tanto do Poder Público como principalmente da iniciativa privada, especialmente dos pequenos negócios, provavelmente alteraria o ambiente de desencanto que mais dia, menos dia, sempre alcança os resilientes rumo ao desfiladeiro.
Resta saber quem colocaria o guizo de reformismo no pescoço dos beneficiários da situação atual. Há latente covardia coletiva de sequer cogitar iniciativa que pudesse aproximar criticamente agentes econômicos e agentes públicos.
UM DESAFIO GERAL
Querem um exemplo do quanto é improvável uma mudança de rumo em favor de “Menos Estado, Mais Empreendedorismo”? Perguntem aos respectivos presidentes do Clube dos Comerciantes, do Clube das Indústrias, do Clube dos Construtores e de tantas outras organizações, se seriam capazes de, em conjunto, produzir um manifesto pacífico, colaborativo, sugerindo aos atuais prefeitos municipais do Clube dos Prefeitos um primeiro encontro para debater minúcias de um plano que honrasse as cuecas de responsabilidade social de “Menos Estado, Mais Empreendedorismo”.
Vamos, leitores: quem conhece dirigentes de entidades locais, sejam patronais, sejam sindicais, sejam sociais, encaminhem-lhes (para reforçar o que recebem diariamente deste jornalista) essa sugestão, esta análise.
Vivemos neste século, como tenho repetido, o pior período institucional da história do Grande ABC. Não que os períodos anteriores tenham sido muito diferentes. Ocorre que jamais naufragamos com tamanha dramaticidade em indicadores sociais, econômicos e fiscais. E vamos piorar. “Menos Estado, Mais Empreendedorismo”, portanto.
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