Regionalidade

MENOS BRASÍLIA E
MAIS GRANDE ABC

  DANIEL LIMA - 11/07/2025

O Clube dos Prefeitos Pedintes inaugura na próxima terça-feira um escritório de representação em Brasília. É a repetição do passado com verniz marqueteiro de novidade e inovação. A iniciativa não resiste a um exemplo prático de mudanças para valer do quadro regional. Revelarei em seguida.

Não é que a representação na Capital Federal não resista a qualquer análise séria e independente. De fato e para valer, se torna, a representação, uma enorme besteira quando se considera hierarquia de prioridades que deveria cultivar a essência programática da instituição rumo ao futuro menos tenebroso do que têm sido os primeiros 25 anos deste século.

Melhor não falar sobre os 25 anos anteriores aos 25 anos deste século. Só neste século o PIB brasileiro corre a uma velocidade 77% superior ao PIB do Grande ABC. E o PIB brasileiro, todos sabem, concorre com cágados. Somos o atraso do atraso. E os prefeitos de agora e quase todos das levas que os antecederam não se deram conta disso. Ou melhor: preferiram descartar o indescartável. Para valer mesmo, a exceção é Celso Daniel. Mais que exceção: exemplo de comprometimento.

Até que ponto a representação em Brasília é mesmo relevante. Afinal, Brasília cai aos pedaços institucionais e se tornou campo de batalha sangrenta por nacos miseráveis de menos de 5% de receitas federais para aplicação livre, ou seja, sem amarras de gastos já definidos num Estado esbanjador e incompetente. Um Estado em estado de putrefação gerencial.

Pois é essa Brasília o que interessa ao Clube dos Prefeitos Pedintes, que se candidata a formar a pior turma do Clube dos Prefeitos do Grande ABC da história. Não parece existir uma alma entre os jovens prefeitos com capacidade mínima de acabar com essa ciranda populista que vem de longe.  Nem o único veterano, Tite Campanella, escapa da armadilha. Tem todos os vieses de vereador de sempre.

De fato, e para valer, o que os Prefeitos Pedintes almejam mesmo é estender tentáculos pessoais e partidários na Capital da República e cultivar imagem mais que falsificada de regionalismo. O conceito de regionalidade que expressam não passa mesmo de ânsia territorialista, sobre a qual já escrevi várias análises. Prefeitos territorialistas tutelados por grupos de interesse. 

DESPERDÍCIO TOTAL

O custo-benefício da representação em Brasília será um desperdício. E não me refiro a valores monetários, porque são ínfimos. A centralidade dessa equação está no desperdício de tempo e foco programático que poderiam ser utilizados internamente, no Grande ABC.

Menos Brasília e Mais Grande ABC não é retórica vazia. É a premissa à reestruturação do tecido econômico regional, com ampla repercussão social.

Já imaginaram os leitores se, ao invés dessa patacoada provinciana de representação física em Brasília,  os prefeitos do Grande ABC e um quadro de especialistas em competitividade municipal e regional marcassem para hoje, na sede da entidade, uma coletiva de imprensa para contextualizar o Grande ABC diante do quadro internacional do tarifaço do governo dos Estados Unidos?

Já imaginaram quanto o Grande ABC ganharia em visibilidade, em compromisso com a sociedade, em organização institucional? Pensem bem, reflitam a metabolizem o que pretendo expor, já expondo.

Algumas questões básicas seriam observadas como nutrientes de preparo e preocupação com a sociedade diante da possibilidade de Brasil e Estados Unidos entrarem em conflito armado no campo econômico se tanto um presidente quanto outro continuarem a trafegar por caminhos dissociados de cooperação mútua.  

QUESTÕES BÁSICAS

Algumas questões são colocadas como sinalizadores do quanto seria o Clube dos Prefeitos se o Clube dos Prefeitos fosse uma entidade minimamente voltada ao que interessa para valer, ou seja, o Desenvolvimento Econômico.

O que vou expor abaixo sem maiores detalhes é apenas o simbolismo circunstancial do quanto o Grande ABC econômico poderia empreender um voo rumo ao futuro se a proposta que se segue fosse também estendida a outros setores industriais, não necessariamente de importadores e exportadores.

Tanto a Doença Holandesa Automotiva quanto a Doença Holandesa Petroquímica não estariam esterilizando o cada vez mais frágil dinamismo econômico regional se ações semelhantes às que exponho de forma preliminar fossem aplicadas. Mas o que se pode fazer quando um bando de prefeitos imaturos às causas regionais se dobra a interesses políticos carreiristas ao invés de honrarem a camisa da regionalidade no sentido produtivo de ser?

BREVE QUESTIONÁRIO

Vamos então a algumas premissas tão elementares e tão inadiáveis que deveriam ter sido colocadas em prática há pelo menos duas décadas.

Os prefeitos atuais perdem uma oportunidade de ouro de se consagrarem como reformistas. Ao seguirem os passos trôpegos dos anteriores, tornam-se piores. Não aprender com os erros dos outros é arrematada estupidez.

O que apresento em seguida exigiria algo que custaria quase nada aos cofres públicos em forma de contratação de consultoria especializada que, em combinação com os poucos especialistas locais, poderia dar rumo e ritmo a transformações viscerais.

Conhecer as indústrias locais e torná-las aliadas em busca de um futuro menos tenebroso é missão básica de agentes públicos comprometidos com a sociedade. Muito distantes, portanto, de aproximações fisiológicas com pares semelhantes e igualmente inúteis às mudanças estruturais. Nossos prefeitos preferem lantejoulas e medidas cosméticas. Desprezam cirurgias invasivas.  

Vamos então a alguns pontos cardeais que remeteriam o Grande ABC à interrupção da derrocada industrial com consequente tração à retomada que se faz urgente. 

1. Quais são os valores monetários e de participação relativa anuais das exportações e importações das indústrias locais, tanto para os Estados Unidos quanto a outros territórios?

2. Quais são os principais produtos das pautas de importação e exportação das empresas do Grande ABC?

3. Qual é o nível de conectividade entre as empresas exportadores e importadoras sediadas na região e seus respectivos fornecedores locais?

4. Qual é o perfil desses quesitos quando se consideram separadamente cada um dos sete municípios da região?

5. Quantos funcionários contratados em regime de CLT as indústrias exportadoras e importadoras da região reúnem?

6. Quantos funcionários constavam da folha de pagamentos de empresas exportadoras e importadoras há 10 anos?

7. Qual é a média salarial dessas empresas?

8. Quanto essas empresas recolheram de IPTU no último ano?

9. Qual é o nível de confiança médio dos comandantes desses negócios quando observam o Grande ABC como um todo em vários quesitos relativos à competitividade interna que influencia diretamente na competitividade nacional e internacional?

10. Numa escala de zero a 10, qual é o valor atribuído às relações institucionais internas especialmente com o Poder Público Municipal?

11. Quais o pontos considerados vitais para que o empreendimento permaneça instalado no Grande ABC e que de alguma forma podem determinar novos investimento locais ou estudos que os dirigiriam a  outras localidades?

12. O traçado regional do Rodoanel favorece ou atrapalha a logística urbana do empreendimento, considerando-se sempre a disputa por investimentos na Grande São Paulo e no Interior do Estado?

13. Quais são as vantagens e as desvantagem que cada empreendimento detecta em relação ao nível de competitividade da concorrência instalada em outras localidades? 

PASSADO CONSTRUTIVO

Não custa lembrar que o questionário sugerido é apenas uma fatia do bolo de incursões necessárias para o Grande ABC sair do retrocesso industrial. A formulação foi simplificada,  mas conta com a praticidade de indicar o caminho à persecução de medidas que retirem a região da escuridão do desconhecimento da atividade que ainda sustenta o que resta de riqueza per capita em constante dilapidação social.

Apenas para lembrar, há quase 30 anos, sob a liderança de Celso Daniel, o Clube dos Prefeitos e a Agência de Desenvolvimento Econômico contaram como ação do governo do Estado. Uma ampla pesquisa estadual fez brotar inúmeros indicadores industriais e também das demais atividades.

Pena que a ação tenha sido relâmpago. A propósito, reproduzo uma das mais de quatro dezenas de análises que LivreMercado publicou sobre o assunto. Uma leitura caprichosa é indispensável. Leitura fastfoodiana não serve como patrimônio cultural a ninguém. Nem aos marqueteiros de inutilidades que precisam conhecer os caminhos que vão trilhar para oferecer vantagens à clientela, independentemente das necessidades sociais.  

 

Mapa da mina

ou rota do caos?

 MALU MARCOCCIA - 05/01/1999 

Exatamente 1431 variáveis de estudos, desde a quantidade de robôs na indústria até quanto do pessoal ocupado possui Terceiro Grau, ou então que parcela do comércio já utiliza leitura ótica de preços e qual o grau de experiência profissional que a construção civil exige para recrutar trabalhadores. 

A grandeza de indicadores apurados pela Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados) impediu que São Paulo começasse 1999 conhecendo com que cara ficou após a turbulenta abertura comercial que varreu a economia mais importante do País. 

A releitura do que sobrou no Estado, com um corte especial sobre o Grande ABC encomendado pelo Consórcio Intermunicipal de Prefeitos, vai vir a conta-gotas, na medida em que a equipe de trabalho for cruzando e interpretando as centenas de respostas dadas por 21.665 empresas que entraram no banco de dados do Seade para compor a Paep (Pesquisa da Atividade Econômica Paulista). 

VÁRIAS REGIÕES

Esse supercenso mapeou em várias regiões do Estado o que acontecia entre 1994 e 1996 na indústria, comércio, serviços de informática, bancos e construção civil. Por ter um pé na informalidade, a área de serviços em geral vai ganhar levantamento à parte.

 O universo de informações além de gigantesco é novo, já que o último censo econômico feito em São Paulo pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) data de 1985; portanto, baseado em matriz produtiva praticamente inexistente hoje. 

Daí a necessidade de o Seade ter criado metodologia específica para mensurar os novos tempos e se ater mais demoradamente sobre o que os pesquisadores trouxeram dos 13 meses em que ficaram nas ruas, a partir de agosto de 1997, justifica o diretor Pedro Paulo Martoni Branco. "Sabemos que as inter-relações mudaram acentuadamente. A indústria automobilística, que trabalhava com até 95% de autopeças nacionais, hoje traz partes inteiras não só de fora do País como de fora de São Paulo. O setor dobrou a produção em 1997 para dois milhões de veículos, mas não necessariamente agregou valor ou gerou empregos. Estamos vendo como isso ocorreu" -- sublinha. 

DADOS PROMETIDOS

 As primeiras análises do censo especial sobre o Grande ABC estão prometidas para entre este e o próximo mês. A técnica Fátima Araújo não arriscou antecipar interpretações, sobretudo em relação a empresas que fecharam ou sobre o deslocamento espacial das que se evadiram, argumentando que outros Estados não foram pesquisados. Nem mesmo perfil preliminar do que é a indústria paulista hoje foi extraído para a primeira apresentação da Paep à Imprensa, no mês passado.

A apresentação apenas ciscou sobre a pesquisa, mostrando potencialidades de temas. Há sinais de enfermidade, como o fato surpreendente de apenas 5,8%  das indústrias oferecerem treinamento de controle de qualidade ao pessoal da produção ou de somente 9,6% das empresas de construção civil possuírem comitês de controle da qualidade. 

Ou ainda: no meio do animador índice de 25,4% de empresas que fizeram inovação tecnológica (próximo dos 27% da Austrália), a grande maioria copiou concorrentes, absorveu tecnologia externa ou comprou bens de capital de fora, ou seja, não fez P&D (Pesquisa & Desenvolvimento) próprio. 

FASES MODERNIZADORAS

Mas a Paep também detectou fases modernizadoras, como 84,6% do comércio já informatizado e 71,4% das indústrias valorizando a capacidade de trabalho em grupo para recrutar pessoal de fábrica.

É a primeira vez que São Paulo e o Grande ABC em particular terão mapa detalhado da oferta pelo lado de produção-serviços e da demanda pelo lado trabalhista. Um recorte da PED (Pesquisa de Emprego e Desemprego) também foi encomendado especificamente para o Grande ABC, desagregado da Região Metropolitana. 

A Paep será organizada na forma de CD-ROM por setores, indicadores e resultados. Ao todo, foram 27.946 empresas pesquisadas no Estado, com retorno de 21.665 (77,5%) e recusa de participar de 4.407 (15%). Isoladamente, o Grande ABC foi mais receptivo: foram recolhidos 87% dos cerca de oito mil questionários e só 8,8% se recusaram a fornecer dados. 

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