Regionalidade

CAPITAL É BARRADA
DO BAILE REGIONAL?

  DANIEL LIMA - 24/07/2025

Até prova em contrário, prova em contrário que parece não existir, o prefeito da Capital, Ricardo Nunes, foi barrado do baile do Clube dos Prefeitos na área de Segurança Pública. Explico logo em seguida. O que me intriga e me estimula a especular está nas páginas de jornais de papel e digitais. Especular no caso ganha conotação de curadoria, não de libertinagem ética.

Os prefeitos da região, mais perdidos estrategicamente do que barata de despreparo em galinheiro de reestruturação planejada, não deram satisfação alguma à escanteada na Capital, Cinderela que a Borralheira tanto inveja. Nosso Complexo de Gata Borralheira flutua entre a autossabotagem estúpida e a inveja subserviente.

É possível que exista uma origem de ciumeira em tudo isso com nome, sobrenome e função: Orlando Morando, ex-prefeito de São Bernardo e secretário de Segurança Urbana da Capital. Os sete prefeitos regionais do Grande ABC sabem que Orlando Morando os botou todos como figurantes em Segurança Pública. E correm atrás do prejuízo. Morando tem feito gols em todos eles. E provoca o que chamaria de Morandite, espécie de alergia principalmente dos prefeitos regionais mais proeminentes, de Santo André e São Bernardo. 

TRANSE ORGANIZACIONAL

Também se deveriam somar ao fator Morandite outros badulaques políticos. Como se sabe, há muito tempo política municipal deixou de ser meramente política municipal ou até mesmo regional. O jogo jogado é mais amplo. Envolve caciques políticos do Estado e fora do Estado. As redes sociais ampliaram focos e ambições. E também intrigas, quando não assassinatos de reputação.

Há políticos supostamente de terceira via que demonizam a polarização como forma de afastar suspeitas e fatos de que pretendem manter proximidade fisiológica com representantes  à esquerda ou à direita, cuja soma é a maioria do eleitorado. São políticos  sem coragem de assumir publicamente que só esperneiam porque são raposas das uvas verdes.

O noticiário de ontem é mais uma comprovação de que o Clube dos Prefeitos Pedintes está em transe organizacional e, por consequência, totalmente fora do eixo. Anunciar a compra de viaturas, drones e motocicletas para uma operação chamada ABC+Seguro, não passa de canelada. Afinal, o prefeito da Capital, Ricardo Nunes, foi barrado do baile. 

OPERAÇÃO-DIVIDIDA

A medida só deixaria de ser uma senhora canelada se houver algum estudo que comprove a necessidade dessa fratura no que foi combinado ainda outro dia com o prefeito da Capital.

Como se sabe e foi amplamente divulgado, trataram todos eles, na sede do Clube dos Prefeitos, de que haveria planejamento e ações conjuntas para atacar o que chamam de ações ostensivas de dissuasão criminal nas divisas. Grande ABC e Capital atuariam em conjunto na área de Segurança Pública.

Se a operação-divisas exclusivamente voltada ao território regional, partido e repartido na metade do século passado, ignora os limites geográficos com São Paulo, aos quais estão conectados praticamente todos os municípios da região, então essa operação-divisas deveria ser chamada de operação-dividida.

Para se ter operação dividida não precisaria convidar o prefeito da Capital, como se chamou e se festejou.  Operação dividida é o que temos desde sempre. E se já temos e no caso o que se pretende são ações locais, meramente locais, deveria chamar-se Operação Gata Borralheira. Afastar-se da Cinderelesca Capital, onde Orlando Morando deita e rola em exposição midiática, é um, tiro no pé. O Grande ABC e a Capital são vasos comunicantes.  

UM PRETEXTO?

Seria Morando o pretexto à fuga do tratado e combinado? Possivelmente sim. Morando é a principal liderança da região nesta temporada. Morando dá elasticidade ao conceito de Regionalidade ao alcançar a plenitude de Metropolização na área mais demandada pela sociedade.

A ação divulgada ontem  nas páginas do Diário do Grande ABC e de outras publicações é tão estapafúrdia que, à primeira leitura, uma primeira leitura que imantou na minha mente, imaginei outra coisa na santa ingenuidade de que não haveria tanta estupidez saindo de sete cabeças.

Imaginei com a mente dos inocentes pragmáticos, até prova em contrário na plenitude de sinapses e cognição, que havia um sujeito nada oculto no anúncio: a participação da Capital do Estado. Afinal, e insisto no que poderia parecer repetição: o prefeito Ricardo Nunes esteve ainda recentemente no Clube dos Prefeitos participando da operação-divisas. 

FALA RICARDO NUNES!

A reprodução de publicações locais seria desnecessária? Talvez não. Leia este trecho do Repórter Diário de 14 de março: 

 O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, disse, durante a primeira reunião com os sete prefeitos do ABC, que quer disponibilizar o que a Capital já tem de tecnologia na área de Segurança Pública: “Com o Smart Sampa, em seis meses de trabalho, colocamos na cadeia 820 foragidos da Justiça, mais de dois mil flagrantes, então é um know how que a gente desenvolveu e podemos compartilhar. Eu tenho um centro de informações com as polícias municipais daqui (do ABC); o uso de tecnologia hoje é fundamental, não se faz segurança sem tecnologia. Estudamos as grandes cidades do mundo que diminuíram a criminalidade e vimos que elas atuaram na questão social, de vulnerabilidade, mas também em efetivo e tecnologia. Ninguém ia colocar 820 foragidos na cadeira em seis meses sem dar um tiro, sem o uso de tecnologia, com o reconhecimento facial e com as identificações (de suspeitos), então a gente tem muita coisa lá de tecnologia para compartilhar, disse o emedebista.

LOUCO PARA TUDO

É até possível porque há louco para tudo que algum suposto especialista venha a público para dizer o que seria uma estupidez ao quadrado: a operação-divisas no Grande ABC, de inserção aplicativa integralmente no Grande ABC, é mais vantajosa ou dispensa conexão com a Capital porque uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.

Claro que eventual escapatória da aberração cometida não tem respaldo técnico algum . A obviedade de que a integração natural entre a Capital e o Grande ABC, desconsiderando-se outros municípios da Região Metropolitana de São Paulo, está na raiz de qualquer movimento de pedras de conectividade na área de Segurança Pública. Não fosse assim, aliás, a lógica sustentada pela presença do prefeito da Capital para tratar do assunto não teria provas documentadas. 

ADEUS, ANDORINHAS 

Juro por todos os juros aos leitores: acordo todas as manhãs disposto a enxergar alguma coisa mesmo que levemente positiva na atuação do Clube dos Prefeitos. Sempre depois de acompanhar pelas redes sociais o quanto cada um deles se dedica ao cargo de prefeito municipal. Mas não tem jeito: provavelmente por encararem os cargos de prefeitos regionais como passatempo político e administrativo, lá vem bomba atrás de bomba.

Pior que isso: eles empesteiam os veículos de imprensa, a maioria de conotação propagandista, de supostos argumentos que denotariam espetaculares iniciativas. Sempre, claro, assessorados por marqueteiros que, mais recentemente, até baniram as sete andorinhas como símbolo visual do Clube dos Prefeitos, substituindo-as por sete setas estilizadas.

Todos eles amam maquiagens e perfumarias. Deveriam mesmo alterar a denominação da entidade para alguma coisa compatível com isso. Não vou fazer nenhuma sugestão. Posso me exceder na inventividade e conduzir a marca para algo proibido a menores de 80 anos.

APENAS MIUDEZAS

Na mesma edição em que o Diário do Grande ABC publica a notícia da operação-divisas, ou ABC+Seguro, à página dois de opiniões o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, ex-prefeito de São Bernardo, assina um comentário de louvação à entidade. É de lascar.

Se o Clube dos Prefeitos fosse mesmo o que Luiz Marinho botou no papel, e se as vantagens de consórcios públicos houvessem sido aplicadas na entidade, o Grande ABC seria bem diferente do que se apresenta.

Não existe a mais ínfima possibilidade de o Clube dos Prefeitos saltar em direção a novos patamares de regionalidade,  estando como está ao ré de miudezas, caso continue o ritmo da chuva ácida de negligência, despreparo, falsa unificação e tudo o mais.

A decisão anunciada com pompa e circunstância sobre a operação ABC+Seguro só existe porque o Clube dos Prefeitos não tem uma carta de navegação em direção a uma reforma de conceitos, partindo como deveria partir de um planejamento elaborado por especialistas em competitividade com o auxíliotécnico de quem conhece as entranhas históricas do Grande ABC. E que não sejam profissionais ideologicamente enviesados, porque se perderá mais tempo ainda.

CENTRO DE GRAVIDADE

Já escrevi dezenas de vezes sobre essa que não é propriamente uma alternativa, mas a própria essência reformista do Clube dos Prefeitos. Nada adiantará à sociedade regional se este jornalista que conhece a fundo a história do Clube dos Prefeitos engrossasse aplausos encomendados às várias iniciativas do atual colegiado maltrapilho em conhecimentos.

Enquanto os prefeitos regionais não se darem conta de que acrescentam camadas e camadas de impropriedades cada vez que lançam alguma coisa sobre a entidade, mais acumularemos fracassos. A Casa de Brasília tem a mesma deformidade da operação-divisas: decorre de improvisações ao sabor de manchetes.

Ou seja: não há um centro de gravidade de conceitos e recursos técnicos e financeiros para estabelecer as bases estruturantes de qualquer coisa que pretenda retirar o Grande ABC da pasmaceira institucional em que se encontra.

SEM FANTASMAS

Mais que isso: que mitigue a cada nova temporada os calafrios ditados pelo descolamento vergonhoso, quando não patético, do crescimento vexatório quase inercial do PIB Brasileiro. Somente neste século –e vou repetir esse número sempre que houver possibilidade – o PIB Regional manteve movimentação de cágado com registro de 77% abaixo da média nacional.  O Brasil Bicho Preguiça é Fórmula-1 em relação ao Grande ABC.

Está na hora dessa turma de Prefeitos Regionais esquecer os fantasmas. A operação- divisas é o contrassenso formal da regionalidade que não passa de territorialismo.

E não seria o senhor Luiz Marinho, mesmo tendo sido um prefeito dos prefeitos que enxergou a necessidade de mais investimentos técnico-operacionais, o detentor da receita desse bolo. Foi durante os dois mandatos à frente da Prefeitura de São Bernardo e também à frente do Clube dos Prefeitos que o Grande ABC passou o pior período econômico da história, com Dilma Rousseff e Brasília. Nenhum alarme soou no Clube dos Prefeitos Cegos e Mudos.

Leia mais matérias desta seção: