Economia

ENSINO SUPERIOR: NEM
0,50% DE CONTRATAÇÕES

  DANIEL LIMA - 06/10/2025

Se os leitores ficaram estupefatos com as duas análises que fiz na semana passada sobre a participação de trabalhadores com Ensino Superior no saldo de empregos formais deste ano no Grande ABC -- e também no Brasil -- sinto muito, porque errei. E errei feio. Sorte que errei feio no cálculo matemático, mas estou salvo sem arranhões na análise. Vou tentar explicar as razões que me levaram ao que chamaria de excesso de otimismo com a economia da região, e que me custou um bocadinho de irritação.

Sorte minha que apareceu na grande área da impropriedade uma jornalista de primeira linha que contribuiu imensamente ao longo dos anos com o sucesso da revista de papel LivreMercado, antecessora de CapitalSocial.

Malu Marcoccia, copidesque, editora, repórter, redatora e tudo o mais de primeira linha, me enviou uma mensagem curta e diplomática, para não dizer simpática,  exatamente às 10h59 de sábado. “Não seria 0,5% de diplomas superiores, em vez de 5,00%???”. E completou a mensagem de texto do WhatsApp com uma tabelinha simples e certeira: 10% de 22.112 contratações líquidas são 2.211 diplomados a mais no estoque de trabalhadores da região em oito meses desta temporada. Na linha de baixo, 5% de 22.112 seriam 1.105 trabalhadores. Mais abaixo: 0,5% de 22.112 são 110 trabalhadores líquidos. Como de fato foram 109, a resposta imediata, no minuto seguinte foi de agradecimento. Realmente errei no cálculo que ela corrigiu com arredondamento. 

SEM ARRANHÕES

Se a constatação foi imediata, sem qualquer possibilidade a argumentação, porque os números são soberanos, o que me restou de satisfatório, além do agradecimento, foi o alivio de que a interpretação toda em torno do que esses dados expressam não sofreu um senão sequer: os profissionais supostamente mais qualificados no mercado de trabalho do Grande ABC e no mercado de trabalho brasileiro estão fora do jogo da empregabilidade consumada.

Malu Marcoccia é dessas profissionais de comunicação que Redação gabaritada  jamais deveria abrir mão.  É diligente, meticulosa, cuidadosa, esclarecedora, técnica, criativa, reflexiva e pedagógica. Muito melhor do que eu. Temos nossas diferenças de estilo, houve situações vividas durante muitos anos na revista LivreMercado que exigiam mais de minha personalidade abrasiva do que de personalidade tranquilizadora dela. Certamente por conta disso, também, que Malu Marcoccia tem muito ativo na imensidão de sucessos editoriais de LivreMercado. Outros profissionais também tiveram, claro, mas a certeza de que contava com alguém em muitos pontos diferentes de mim instrumentalizava o paradoxo de que potenciais conflitos de personalidade são o combustível perfeito ao melhor resultado.

Então, ficamos assim: no Grande ABC, apenas 0,493% dos empregos formais gerados este ano (mais de 22 mil) foram preenchidos em termos líquidos por profissionais com Ensino Superior completo. No Brasil, em média, foram 0,680%. Mantiveram-se, portanto, as razões básicas e as respectivas proporcionalidades.

MAIS GRAVE

A diferença é que a realidade é ainda mais grave. Os supostamente melhores candidatos do ponto de vista educacional não encontram um mercado de trabalho que os encantem, ou os empregadores demandantes miram mesmo trabalhadores menos preparados, mas mais de acordo com o suporte remuneratório? Uma coisa não exclui outra coisa.

Essa situação toda remete ao reforço da mensagem naquelas duas análises, agora com estridência alarmante: senhores condutores dos cordéis políticos, principalmente políticos da região, por favor, deixem de lado proselitismos eleitoreiros e tratem de seguir as breves sugestões que teimosamente apliquei: coloquem o Desenvolvimento Econômico do Grande ABC em primeiríssimo lugar. Coloquem as demais temáticas no banco de reservas. A emergência está na cara.

Agora, para completar, vou tentar entender as razões que me levaram a transformar 0,493% e 0,680% em 4,70 e 6,80%. Só pode ser coisa de ufanista. Devo ter sido contaminado por agentes externos em redes sociais, alguns dos quais se levantaram contra os dados que apresentei, como se os dados que apresentei fossem pessimistas. Esses agentes duvidavam do que apresentei na primeira matéria sobre a situação do emprego de Ensino Superior na região. Por isso,  certamente fui induzido  à formulação matemática também equivocada quando tratei do caso brasileiro.

MAIS VIGILÂNCIA

O pior de toda essa história é que agi como um cego ao esmiuçar os dados sob o princípio de que aqueles 4,93% pareciam inexpressivos demais e que, portanto, exigiam aferição detalhada, rigorosamente detalhada. Nem assim enxerguei o que a Malu Marcoccia resumiu na mensagem. Não é mesmo intrigante que não tenha enxergado antes sob a lupa da autodesconfiança o que Malu Marcoccia apresentou horas depois com clareza meridiana?

O bom dessa história toda é que estou certíssimo sob um ponto de vista de algo que escrevi ainda outro dia e que ainda não editei nesta revista digital. Fiz breve avaliação, mais uma por sinal, sobre o comportamento da mídia em geral, agora da mídia de grande porte. Escrevi que é preciso desconfiar de todos os jornalistas, absolutamente de todos, nestes tempos de polarizações diversas, assim como deveriam ter sido duramente questionados os jornalistas dos tempos de compadrios entre tucanos e petistas.

Ou seja: o problema não é propriamente destes tempos polarizadores, mas das reais intenções dos jornalistas e jornais em geral, além claro, da longa lista de colunistas que não são jornalistas e, em grau mais elevado, podem levar os leitores no bico. Não pensem os leitores que estou fora da lista sugerida por mim mesmo. Acho que todos devem ser observados por gente que não tenha rancor nem ignorância como insumos persecutórios.

Acho que todo jornalista que se preza deveria contar diariamente com alguém muito competente em jornalismo para verificar suas escritas antes da edição. Sinto muita falta dessa parceria que durante muitas temporadas de LivreMercado vigorou naturalmente. Fosse isso estendido a estes dias, a medição dos diplomados não teria sido superestimada, mesmo que essa equação não tenha comprometido a argumentação um milímetro sequer.

Minha fórmula mágica para cercar o burro de equívocos em campo aberto de probabilidades é, entre outros ingredientes, deixar o texto decantar durante pelo menos 40 minutos e, em seguida, vasculhá-lo o quanto possível, seguindo-se, antes da edição digital, à impressão  para apanhar eventuais equívocos reminiscentes. Sim, não há nada melhor para quem lida com qualidade no jornalismo do que o texto impresso para correções antes da edição final. O que os olhos veem no papel os mesmos olhos muitas vezes não veem na tela de um computador. A acuidade no papel é mais confiável .  A Ciência comprova.  

Leia mais matérias desta seção: