Esportes

Santo André reage com
“Esta é minha camisa”

  DANIEL LIMA - 15/12/2023

Se dentro de campo na próxima temporada o Santo André acertar como acertou com o mote do lançamento da nova camisa que o identificará durante a Série A-1 do Campeonato Paulista, muitos resultados serão comemorados. “Esta é minha camisa” tem um conteúdo objetivo e subjetivo extraordinário.  

Quer fazer uma prova prática, pragmática, reta e direta? Leia de novo o mote da campanha. “Esta é minha camisa”. Pare a leitura por alguns minutos, reflita e retome. O que você entendeu sobre “Esta é minha camisa”?  

“Esta é minha camisa” transcende o que para muitos seria apenas uma frase de efeito ou de afirmação de torcer para o Santo André.  

“Esta é minha camisa” tem um valor múltiplo. Possivelmente será o tiro de largada de uma provável campanha de pertencimento de quem tem o Santo André como patrimônio emocional e cultural mais valioso da cidade. E também de quem anda rateando paixão, entusiasmo e bem-querência pelo Santo André.  Sem contar, também, os insensíveis.  

MAIS IMPORTANTE  

Alguém tem dúvidas de que o Santo André é a instituição popular mais proeminente na história da cidade quando se tem como métrica o sentimento particular de valorização da cidadania esportiva?  

Mas não se pode deixar de lado a realidade dos fatos históricos que tornam “Esta é minha camisa” algo muito maior e transformador. E providencial no sentido de que estava ou já havia passado da hora de o Santo André encontrar-se consigo mesmo, ou seja, chamar para si um projeto que mexe com a sensibilidade da cidade.  

Se o objetivo for mesmo colocar em campo uma campanha de valorização das cores do clube em meio às dificuldades cada vez maiores de resistir à avalanche que os meios de comunicação dedicam às grandes equipes da Capital, o acerto é extraordinário. 

Não será tarefa fácil resgatar o Santo André de um passado mais robusto nas arquibancadas e nas relações cotidianas. Mas é preciso dar um passo adiante que parece está sendo dado agora.  

RESGATANDO PASSADO  

“Esta é minha camisa” joga para escanteio um sentimento disseminado no passado e muito presente de forma ainda mais consolidada. O Santo André de camisa dividida com os grandes clubes paulistas jamais será abandonado como a reprodução de uma realidade cultural implacável.  

Entretanto, com “Esta é minha camisa”, o clube poderá resgatar a força de um passado mais representativo e mexer com os brios da torcida e dos moradores em geral que o colocaram em segundo plano.  

O calendário do futebol brasileiro está na raiz do problema. Há muito a equipe está limitada e condicionada a poucos meses de competição estadual. 

Não adianta argumentar que o Santo André tem disputado a Série D, ou Quarta Divisão, do Campeonato Brasileiro. Isso é pouco e como é pouco não desperta maiores emoções. Essa é uma barreira que precisa ser transposta.  

Outros clubes paulistas com os quais o Santo André dividia forças (Ituano, Mirassol, Botafogo de Ribeirão Preto, Novorizontino) estão na competição estadual com a vantagem de contar com calendário amplo. Quem tem calendário tem receita garantida. E quem tem receita garantida tem vitalidade competitiva.   

“Esta é minha camisa” tem dimensões múltiplas, portanto. Não é um slogan qualquer, fabricado por marqueteiros vazios que lançam na praça, em qualquer atividade humana, fórmulas supostamente mágicas de experimentos em busca de consumidores.  

MÚLTIPLAS DIMENSÕES  

O Santo André já tem consumidores de sobra, embora a maioria ainda esteja submersa num distanciamento ditado pela implacabilidade determinada pela competição dentro de campo. “É o calendário” está para o presente do Santo André assim como “é a Economia” está para a maioria dos resultados eleitorais”.  

O Santo André precisa estar no calendário da Série B do Campeonato Brasileiro (a Série C já quebraria o galho num primeiro momento) para estabelecer programação contínua e estável de valorização da marca que detém há mais de seis décadas.  

Tomara que o mote “Esta é minha camisa” tenha profundidade e capilaridade. O Santo André precisa mobilizar instituições e corporações privadas que sofrem com a baixa representativa da marca do Município como um todo – nada diferente dos demais – desde que a identidade de região próspera sofreu avarias contínuas e hoje o que resta a olhares externos é uma geografia em crise econômica.  

ACORDA, GENTE! 

“Esta é minha camisa” é um chamamento sutil às forças vivas de Santo André que pretenderem sair do casulo restrito a negócios e entendam que a valorização do produto chamado futebol transforma a sociedade. Uma cidade que transpira futebol conta com um ativo emocional e transformador imenso. Uma sociedade não morre ou não se entrega quando valores intrínsecos a mantém acordada, ativa e participativa.  

Um exemplo? Dê uma passadinha de um dia em Porto Alegre, em Salvador, por essas capitais que têm representantes em competições de destaque do futebol brasileiros. A paixão esportiva molda comportamentos e ações que vão muito além do campo de jogo. Todos têm a ganhar com a quebra de relações individuais e coletivas anestesiadas.  

As mudanças tecnológicas podem e estão afetando as relações municipalistas e regionalistas. Há concentração da pauta no campo político nacional. Mas sempre haverá a possibilidade de, mesmo nessas circunstâncias, sobreviverem nichos esportivos que catalisem atenção. 

Tudo é questão de estabelecer metas. No caso do Santo André, clube de maior tradição no futebol da região, e único que se sustenta num modelo associativista, o caminho do agigantamento seria menos doloroso e desafiador.  

ESSÊNCIAL PSICOSSOCIAL  

“Esta é minha camisa” de fato é um chamamento que, na medida em que for compreendido na essência psicossocial com que provavelmente foi concebido, demarcará uma nova fase do Esporte Clube Santo André. Tudo vai depender do espraiamento prático da força implícita do projeto.  

Ainda outro dia me manifestei desconsolado com o estágio em que se encontra o Santo André, à espera da boia salvadora de uma SAF, modelo que se espalha pelo País como a melhor alternativa para o futebol de alta competição.  

Há dois anos há trava da Prefeitura que impede avanços no sentido de que o Santo André tenha liberdade e autonomia para tratar com interessados. Quem sabe com a mobilização em torno de “Esta é minha camisa”, a gestão municipal decida interromper esse distanciamento?  

Perdeu-se muito tempo até agora e se espera que não se perca mais. Enquanto a banda de dúvidas continua a tocar, a expectativa é de que se configure uma velha máxima. Que máxima? Nem tudo que tarda, falha. Será que existe essa máxima? Se não existir, acabei de cria-la. 

A tradução é o seguinte: a Prefeitura não tem assimilado a importância da concessão do Estádio Bruno Daniel, sem a qual não haverá um único pretendente à SAF do Santo André. O que quero dizer com isso? Que de tanto esperar e parecer desesperançoso, o Santo André encontrou inspiração e força para se lançar a uma empreitada estratificada na frase que constará da camisa em lançamento como ponto de partida rumo ao Campeonato Paulista mais difícil de todos os tempos.  

Ou alguém tem dúvidas de que o Santo André temporão, ou seja, o time que aparece três meses para valer no calendário do futebol brasileiro, enfrentará um mar de dificuldades tendo entre os demais 15 clubes da Primeira Divisão Paulista nada menos que 11 da Série A e da Série B do Campeonato Brasileiro? 

COMPETIÇÃO DESIGUAL  

Quem disputa essas duas competições parte pressupostamente muito à frente dos demais, das divisões inferiores. É uma largada potencialmente destruidora de ilusões. O Campeonato Paulista é uma prova de 100 metros e conta com vantagem teórica quem já vem mais preparado, músculos afiados das maratonas do Campeonato Brasileiro.  

São equipes que ganham tração ao longo da competição anterior, em nível nacional, e fazem reparos, apenas reparos, para o Estadual. O Santo André é uma aeronave que sai da montagem das peças sem tempo para experimentos. É contratar, treinar e ir a campo.  

Há uma lógica de mercado, e o mercado do futebol não foge à lógica de mercado, que determina o valor de investimentos, de comprometimento, de tudo que se possa imaginar como empenho num empreendimento com formato de SAF.  O Santo André destes tempos não conta com essa configuração, embora também esteja longe de constar de qualquer bacia das almas em termos de valorização. 

Com possível sucesso que está na inscrição “Esta é minha camisa”, redentora em forma de autoestima elevada, fugindo portanto da premissa de camisa dividida ou camisa esquecida, o Santo André ganhará musculatura para elevar as receitas que o colocariam num patamar de maior probabilidade não só de seguir na Série A-1 como também, em seguida, disputar para valer a Série D do Brasileiro, cujo acesso é reservado ao quatro primeiros colocados.  

CLARÃO DE ESPERANÇA  

“Esta é minha camisa” é uma ideia luminosa que abre um clarão de esperança rumo ao futuro do Santo André. Resta saber quais e quantas forças populares e corporativas vão entender que a marca da agremiação é um bem valioso, historicamente agregador, e que ultrapassaria as linhas dos gramados como força propulsora de um chega-pra-lá na apatia geral – muito além de esportiva.

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